Mantenha-se curioso
A falta de curiosidade pelo mundo e pelos outros quando se tem acesso à informação é um sinal de que o próprio umbigo está envolvente demais para desviar o olhar para o lado
“Eu não gosto de política”, disse, do auge dos meus 19 anos, no primeiro semestre da faculdade, em uma aula de introdução ao jornalismo. “A gente costuma não gostar daquilo que a gente não entende”, recebi o corte certeiro do professor que insistia que deveríamos compreender de tudo um pouco sem ser especialista em nada para nos formarmos bons repórteres. Senti as bochechas quentes, envergonhada. Fiquei constrangida ao perceber que estava sendo simplista em um meio de interessados por tudo e por todos. E captei a dica: se eu quisesse ser uma boa contadora de histórias, primeiro eu precisaria me tornar uma boa ouvinte – ou, pelo menos, uma boa curiosa.
Não me tornei uma cientista política. Fujo de debates mais intensos em que reconheço que não terei nada a acrescentar. Mas tô por dentro. Me informo. Como diz a gíria: dou os meus pulos. Assim é com a bolsa de valores, o golfe e a astrologia, por exemplo. Temas que salpicam por aí, que busco compreender, consigo participar em uma roda de conversa, mas que não me aprofundo com paixão como a literatura, o cinema e as técnicas de storytelling. Afinal, precisamos escolher as nossas batalhas – me disse alguém ainda hoje.
Contudo, a voz daquele professor volta e meia retumba na minha cabeça quando percebo que estou recuando por falta de conhecimento – que temo soar como desinteresse. Principalmente, com pessoas. No final do ano, uma marca bacana me chamou para uma reunião para entender de que maneira poderíamos trabalhar juntas em 2023. Me prontifiquei para o café, abri a brecha na agenda, estudei um pouco o “quem somos” do site do possível cliente e cheguei no horário combinado. Logo nos primeiros cinco minutos de conversa, percebi que a moça não sabia nada sobre mim. Colunista da Zero Hora? Sério? Mas então tu não escreve só sobre viagens? Estranho, não tinha essa visão de ti... ela concluía conforme eu relatava minhas experiências. Tá bem, tá bem, ela não tinha obrigação alguma de conhecer meu currículo, e eu estava lá disposta a me apresentar. Mas fui percebendo outros traços. Ela também não identificava quem eu mencionava, tampouco as outras marcas ou cases do segmento. Desculpa, ela disse, sou bem desligada mesmo.
E o que no início me pareceu até engraçado, no final pesou como arrogância e prepotência. Porque a falta de curiosidade pelo mundo e pelos outros quando se tem acesso à informação é um sinal de que o próprio umbigo está envolvente demais para conseguir desviar o olhar para o lado. Frequentemente, reconheço esse comportamento que pinça até com um certo orgulho “ah, eu nem sei quem é quem, sou bem desconectado”, e me questiono o quanto este desconhecimento simboliza apatia. Não entender um determinado assunto é absurdamente normal, mas não perguntar ou buscar saber é passar longe da modéstia e do cuidado. A ideia é se manter atento aos movimentos à volta e às histórias alheias para não se tornar um egóico disfarçado de inculto ou avoado. Acredite, no fim das contas, sempre dá para perceber.
Muito boa a tua reflexão Fe. Nos últimos anos, a importância de saber de outros mundos além do nosso próprio, tem estado no meu radar. Confesso que já fui essa avoada do texto e me dou conta do quanto isso impede novas conexões. Beijo! ❤️
Eu me acho uma pessoa curiosa! Sem querer esbarramos contigo no Youtube, maratonamos o anti-noiva e fui atrás saber quem era, aí acabamos maratonando os vídeos de viagens, te descobrimos no insta e add o Felipe, a Camboatã, a familia toda e acompanhamos os eventos, os jantares, a rotina, a vida nunca mais foi a mesma....ah como é bom ser curiosa....te amamos! Bjos meu e da Ju.